Para que
organizações avancem na pauta, especialistas — e a própria história — apontam
que lideranças, ainda predominantemente masculinas, devem agir intencionalmente
e com rapidez
Por Andrea
Assef
Um dos
grandes perigos do excesso de uso de algumas expressões na agenda da
diversidade é o seu desgaste e esvaziamento. Já aconteceu com “empoderamento”,
“protagonismo”, “lugar de fala”, entre outras. Para tirar as aspas de “aliado”
(quando o assunto é o papel dos homens na luta pela equidade de gênero nas
empresas), e mantê-lo fora dessa lista, é preciso transformar a palavra em
ação.
Estudos e
especialistas sobre equidade de gênero em ambientes corporativos são unânimes
em apontar que ser aliado não basta, é preciso agir intencionalmente, com mais
rapidez e a partir do topo da liderança. “Enquanto os líderes, que ainda são
predominantemente homens brancos, não abraçarem, de fato, a agenda da equidade
de gênero e compartilharem o poder com mais mulheres em cargos de liderança, o
movimento será limitado”, afirma Isabela Venturoza, antropóloga e facilitadora
de grupos reflexivos com homens.
Um estudo
da Promundo-US, em parceria com a Kantar TNS, revelou que enquanto 77% dos
homens disseram fazer tudo o que podem para alcançar a paridade de gênero,
somente 41% das mulheres concordaram com isso. E mais: 60% dos entrevistados
(entre homens e mulheres) afirmaram que é raro encontrar homens se manifestando
abertamente contra a discriminação de gênero. A pesquisa foi realizada em 2019,
com 1.201 adultos com idades entre 25 e 45 anos, de todas as regiões e
principais grupos étnicos dos Estados Unidos.
Como CEO, é
importante assumir a causa e ser um aliado efetivo para que essa transformação
aconteça. Sem o interesse genuíno da alta liderança, a pauta da diversidade,
como um todo, e a da equidade de gênero, em específico, não se tornam uma
prioridade e não avançam”, afirma Filipe Bartholomeu, CEO da AlmapBBDO.
Além de ter
o Pacto Global da ONU como cliente, a AlmapBBDO é signatária e o próprio
Bartholomeu foi convidado, em 2022, para ser uma Liderança com Impacto e
porta-voz do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 10, pela redução das
desigualdades, que tem como uma das premissas a inclusão social, de gênero, de
raça, entre outras. “Em 2020, tínhamos 43% de mulheres em posição de liderança.
Atingimos 50% em 2021 e, em 2024, temos 57% de mulheres nas posições de
liderança da AlmapBBDO”, diz.
Assim como
Bartholomeu, Hugo Rodrigues, presidente do conselho do McCann Worldgroup para
WMcCann, Craft e Aldeiah, sabe que a intencionalidade em cada processo de
recrutamento é o que faz toda a diferença na busca verdadeira pela equidade de
gênero e pela diversidade em geral. “A partir da minha chegada na WMcCann, no
final de 2017, passamos a ter a maioria de mulheres também nas lideranças –
hoje, elas estão em 63% em cargos de liderança –, e, como presidente do
conselho, indiquei a Renata Bokel para a presidência da agência WMcCann em
2023”, recorda Rodrigues.
Desconstrução social
Na opinião
de Venturoza, a própria transformação da frase de Lacan em um aforismo é
reflexo da narrativa masculina sobre a história das mulheres. “Isto é o que já
está no pensamento de mulheres e feministas há séculos. Pensadoras em
diferentes registros provocaram as sociedades pelas quais passaram com a ideia
de que enquanto homens, mulheres e outros, somos construídos no social, pela
cultura, em processos de simbolização, pela linguagem”, afirma.
E essa
construção do feminino passa pela experiência pessoal de cada um. “Tive a sorte
de ser liderado por mulheres desde o meu nascimento: minha mãe foi quem me
ajudava na educação, mesmo com os limites de não ter se formado; minha avó foi
minha grande mentora e guia na vida; minha bisavó, que morreu aos 91 anos e
teve 13 filhos, foi quem ajudou os filhos, netos e bisnetos na formação e
conduta”, conta Rodrigues. Para ele, toda essa vivência fez com que sempre
visse mulheres de forma igual. “Quando cheguei na presidência da Publicis, em
2013, lançamos o Publicis Plural, e em pouco tempo tínhamos mais mulheres no
board do que homens”, lembra.
“Nossa
principal missão é fazer o homem realmente refletir sobre seu modo de agir
consigo, com o outro e com a sociedade”, afirma Pedro de Figueiredo, fundador
do Memoh (“homem” escrito de trás para frente), negócio social que tem como
principal objetivo debater um dos assuntos mais importantes da sociedade
contemporânea, que é a desconstrução da masculinidade tóxica. “Já passou da
hora de nós, enquanto homens, assumirmos nosso lugar na história e estar junto
na luta por uma sociedade equânime”, diz Figueiredo.
Para
Bartholomeu, o grande desafio hoje, além de continuar atraindo novas mulheres
para a agência, é o engajamento e a retenção das colaboradoras em toda a sua
jornada profissional na empresa. “Por exemplo: algumas mulheres serão mães.
Isso é um fato. Então, temos que promover um ambiente acolhedor para as mães,
mas também cobrar dos pais que assumam seu papel na parentalidade e criar
mecanismos para isso, como o aumento da licença para não aumentar o gap”,
afirma o CEO da AlmapBBDO.
“Homens
também têm gênero. Mas o homem não entende isso porque não se sente parte da
conversa, já que se enxerga como o ser universal, a referência da humanidade”,
ressalta Figueiredo.
O Memoh é
uma iniciativa que funciona em três frentes: promovendo encontros virtuais que
debatem as questões que giram em torno da masculinidade, produzindo conteúdos e
prestando consultorias corporativas. “Fazer um evento na empresa não muda a
vida de ninguém; é preciso um comprometimento constante, no dia a dia. E, sim,
é claro que vamos perder privilégios, mas precisamos estar do mesmo lado que as
mulheres”, afirma.
Saiba mais sobre a matéria em: Women To Watch | Marketing, Mídia e Comunicação (meioemensagem.com.br).